Coréia do Sul usa inovação digital na luta contra o Covid-19: lições para o Brasil
O Brasil tem o que aprender com o modo como a Coréia do Sul usou TI e Telecomunicações para lutar contra o Covid-19. Nesse momento dramático do planeta, vale a pena estudar o conceito de resiliência digital adotado pelo governo coreano, em que uma infraestrutura pré-existente, construído a partir da epidemia SARs, em 2015, mostrou seu valor agora. A rede nacional criada a partir de 2015 propiciou o ambiente perfeito para desenvolver e implementar soluções muito inovadoras e que contribuíram para diminuir o efeito do coronavírus no país.
É o que diz Seon Kui Lee, diretor da divisão de controle de riscos do KCDC (Korea Center for Disease Control and Prevention, centro coreano de controle e prevenção de doenças): “TI e Telecomunicações são fundamentais para ir além de estratégias tradicionais de controle de doenças – a inovação digital nos ajuda a derrotar a doença”.
Os resultados dessa estratégia são palpáveis. No início de abril, para cada 1 milhão de coreanos, havia um morto por COVID-19. Nos EUA, no mesmo período, para cada 1 milhão de norte-americanos, havia 39 mortos. A curva de crescimento do novo coronavírus na Coréia do Sul está sob controle, enquanto os índices de contaminação nos EUA só fazem subir. Algo que, infelizmente, também acontece no Brasil.
Devido à rapidez dos fatos recentes, ainda não é possível contabilizar os ganhos que a soma da inovação digital com as melhores práticas de saúde trouxe para a economia da Coréia do Sul. É seguro afirmar, porém, que onde vidas foram poupadas, a velocidade da recuperação será maior.
Monetização de dados a favor da vida
O que os profissionais de TI e Telecom da Coréia do Sul fizeram nada mais foi do que explorar tecnologias que já existiam e eram usados em aplicações de monetização de dados para um fim muito nobre: salvar vidas. A partir da acelerada digitalização de todo o país, começaram a surgir cidades inteligentes e toda uma infraestrutura que permitiria uma rápida e muito eficaz resposta à crise.
A Coréia do Sul conta com redes 5G desde abril do ano passado – hoje mais de 5 milhões de pessoas utilizam esse padrão. Com o suporte de gigantes privados como a LG Uplus, SK e KT Telecom, a Coréia do Sul conseguiu digitalizar o país desde seus rincões até seus aeroportos, hospitais, residências. O país conta com uma infraestrutura que utiliza segmentos 5G, 4G, 3G, Wi-Fi, LoRa, etc. A mensagem é clara: qualquer que seja a distância dos grandes centros, qualquer que seja a atividade econômica da região, qualquer que seja o orçamento, era essencial digitalizar o país.
Veja abaixo as inovações que a Coréia do Sul utilizou para lutar contra o Covid-19:
Dados de smartphones ajudam a rastrear pessoas: Autoridades coreanas estão usando dados de localização de telefones móveis, registros de transações com cartão de crédito e gravações de circuitos fechados de TV para rastrear e testar pessoas que poderiam haver entrado em contato recentemente com uma pessoa infectada. Uma abordagem de BigData/Analytics e Inteligência Artificial utiliza dados de dispositivos GPS e automóveis para identificar casos de alta prioridade e rastrear as rotas de indivíduos infectados. O resultado do cruzamento desses dados é uma série de mapas muito detalhados que mostram os movimentos de pessoas infectadas. A meta é entregar informações suficientes ao cidadão, de modo a própria pessoa perceber seu grau de vulnerabilidade e buscar testes para diagnosticar a possível contaminação por COVID-19.
Cidades inteligentes: A cidade de Daegu, onde ocorreu a maioria dos casos de COVID-19 na Coréia do Sul, está se transformando em uma cidade inteligente. A investigação epidemiológica durante o surto foi capaz de usar o data hub desta cidade inteligente para rastrear as rotas dos pacientes. Os dados são gerados por milhares de dispositivos IoT implementados na cidade e pela monitoração dos smartphones dos cidadãos.
Controle de viajantes: Desde o surto de SARS em 2015, os viajantes que entram na Coreia do Sul têm sido obrigados a submeter-se a verificação de febre e a preencher um questionário de saúde. Uma sofisticada infraestrutura de TI e Telecom em aeroportos, portos e postos de fronteira é “acesa” pelo smartphone do passageiro ou pela imagem do seu rosto. Passageiros chegando com sintomas, vindos de países vulneráveis à pandemia, são colocados em quarentena. Informações sobre o viajante são coletadas no momento da entrada e cruzadas com dados de sistemas do Ministério da Justiça, do Ministério do Exterior, de empresas aéreas e das principais operadoras de telefonia. O grande gestor desse ambiente é o time de TI e Telecom do KCDC.
Numa escala mais simples, conquistas como essas começam a ser desenvolvidas também no Brasil. Vale destacar a atuação da Coordenadoria de Inovação Digital da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, que desde o início da crise já criou e disponibilizou para a população Apps e portais como www.saopaulo.sp.gov.br/coronavirus para divulgação de informações sobre saúde.
Privacidade de dados: a próxima batalha
Nesse momento de grave crise, todas essas estratégias estão deixando de lado os cuidados com a privacidade dos dados sobre a população coreana. A Coréia do Sul conta com a lei Personal Information Protection Act (PIPA), regulamentação ignorada pelo governo durante a guerra contra o COVID-19. Essa será a próxima batalha digital: definir que dados coletados no início de 2020 serão apagados e que dados serão preservados dentro de uma visão que respeite a lei coreana de privacidade de dados.
A cura virá mais rápido para quem construir uma infraestrutura digital distribuída, suportando e estratégias para prevenir o contágio, diagnosticar e tratar pessoas em situação de risco. A hora da mudança é agora.
*Paulo Henrique Pichini é CEO & President da Go2neXt Digital Innovation.